Nerd Show: Wesley Iguti!
- Este texto foi originalmente publicado no site Melhores do Mundo (http://melhoresdomundo.net/nerd-show-wesley-iguti/) em 29 de novembro de 2011. Quando o acessei para transpor para cá, as imagens originais já haviam se perdido, portanto tive que inserir outras. Provavelmente algumas deles serão anacrônicas -
Faaaaala negada! Retomando um hábito há tempos perdido neste
blog imundo, façamos um Nerd Show! Pra quem é leite com pêra ainda e não sabe
do que se trata, o Nerd Show nada mais é do que uma entrevista… Nerd! Ou seje:
nerds babões (nós) entrevistando nerds (ou não, muito pelo contrário) fodões.
O entrevistado de hoje é o Wesley Iguti, escultor de brinquedos da Tot Toys. Wesley, de 30 anos, é filho do também escultor de brinquedos Wilson Iguti – ambos altamente premiados nas feiras e eventos especializados pelo Brasil (e além!) afora. Segue aí que a entrevista ficou bem legal!
O entrevistado de hoje é o Wesley Iguti, escultor de brinquedos da Tot Toys. Wesley, de 30 anos, é filho do também escultor de brinquedos Wilson Iguti – ambos altamente premiados nas feiras e eventos especializados pelo Brasil (e além!) afora. Segue aí que a entrevista ficou bem legal!
Antes de mais nada, Wesley, conta pra gente um pouco sobre a sua carreira.
Bem, hoje me julgo como diretor de criação da Tot Toys, mas sou publicitário com pós-graduação em 3D…e até hoje pratico muito o plastimodelismo. Desenvolvo produtos para brindes e brinquedos, o que me proporcionou fazer trabalhos direta e indiretamente para empresas como Globo, Record, SBT, Bandeirantes, Disney, Marvel, DC, Warner, Hanna-Barbera, Pixar, Dreamworks, BlueSky, Cinemark, McDonald’s, Estrela, Brinquedos Bandeirante, Mimo, Abril, W/Brasil… E várias outras grandes empresas.
Como foi a entrada no mercado de modelagem de brinquedo? Sei que o seu pai também é do ramo, mas, peralá, existe um mercado de modelagem de brinquedos no Brasil? Onde ele se esconde?
A entrada no ramo de modelagem foi caseira (risos),
acompanhei desde cedo meu pai desenvolvendo brinquedos. Enquanto ele ficava
trabalhando eu ficava ao lado dele conversando, perguntando, desenhando… Sempre
gostei de artes, então meu pai para me estimular me deu um pedaço de massa de
modelar e eu acabei fazendo o símbolo da Globo em 3D…acho que devia ter menos
de 4 anos, porque depois no pré [primário] eu modelei um monte de coisas que
deixavam a professora louca. Ela guardava minhas modelagens, mas quando eu ia
pegar de novo as crianças do período da tarde já tinham despedaçado de tanto
brincar, mas nunca amassados como das outras crianças. Acho que a outra turma
tinha dó de amassar, então tentavam brincar com o que eu tinha feito.
Com uns 9 anos ajudei meu pai pela primeira vez em uma
modelagem que viraria brinquedo. Quando criança eu pirava em robôs, naves
alienígenas e dinossauros. Sabia características e até nome científico de um
monte de dinossauros. Então um dia meu pai chegou com um trabalho da Mimo, que
era para modelar uns 4 dinossauros. Enquanto meu pai modelava eu dava pitacos
de quais eram as características e que posições ficariam legais… Foi aí que ele
me deu um pedaço de massa e pediu para eu demonstrar. Enquanto ele modelava eu
fui fazendo, até que ele viu e se surpreendeu… Mandou eu esboçar todo o resto.
Até hoje ele me diz que ficou impressionado com a noção de proporções que eu
tinha na época. Depois disso eu comecei a ir de vez em quando nas reuniões com
ele. Assim esperava ganhar brinquedos dos clientes, ou uma sacola de gibis
quando ia na Maurício de Sousa com ele. Fiz tanto isso que acabei aprendendo tudo,
a modelagem vendo ele fazer e as explicações técnicas quando acompanhava ele
nas reuniões. Durante as férias escolares eu ficava ajudando meu pai no
trabalho, isso desde muito cedo… Tanto que quando comecei a trabalhar direto,
com 15 anos, já sabia fazer de tudo. A grande diferença entre meu pai e eu é
que eu tive tudo de mão beijada, e ele teve que correr atrás de tudo. Claro que
teve que ter meu interesse, tanto que hoje temos estilos um pouco diferentes.
Mas devo tudo que sei a ele, com certeza.
Como funciona hoje a modelagem em vinil (ou em outros
materiais físicos) com a popularização de softwares de modelagem digital?
Continua a mesma coisa. Tem trabalhos que são melhores de
serem feitos em CG, outros no método tradicional. Isso varia muito do resultado
em que se quer chegar, a quantidade que será produzida, a finalidade, o
público-alvo. Na França encontrei um artista que faz as mesmas coisas que eu e
ele me disse que fazia da mesmo forma que faço… Então acho que está tudo igual.
Sem qualquer trocadilho com os toy art, hoje em dia o
nível de detalhamento e cuidado com peças de memorabília, por parte dos
fabricantes, é assustador – há figuras tão bem feitas e detalhadas que a gente
chega a ter pesadelos só de pensar em alguém “brincando” com elas. Viraram arte
mesmo. Mas existe também um reconhecimento do modelador como um artista? Se
sim, pode dizer alguns que você particularmente admira?
Reconhecimento de modelador pra mim acho que basicamente
é de outro modelador… Ou quando a pessoa é fanaticamente doente por bonecos.
Reconhecimento em geral mesmo acredito que ainda não. Acho que as pessoas
admiram o talento, a paciência, o conhecimento… Mas no quesito dar valor acho
que estamos engatinhando ainda. Não falo isso pra modelagem apenas, mas o
artista em geral, em todas as áreas. Convenhamos que nunca tivemos em nossa
cultura um forte incentivo para as artes. O governo acha que incentivar a arte
é apenas dar dinheiro para projetos, e depois se gabam colocando quinhentos
logos enfatizando que foi financiado por eles. Esse ano tive a oportunidade de
fazer um tour pela Europa, confesso que voltei confuso. Primeiro que nunca
tinha ficado mais que 10 dias sem modelar algo, segundo porque foi um choque
chegar aqui e ver como falta arte no nosso cotidiano. Em Paris os museus são
cheios de excursões escolares e de turistas. As crianças são orientadas pelos
professores com explicações obra por obra, e com questões levantadas por eles e
pelas próprias crianças. As crianças não se sentem pressionadas a decorar e sim
são incentivadas a compreender as técnicas… E quando dá na cabeça dos artistas,
ou o que eles quiseram expressar. Lá todo mundo, engenheiro, padeiro,
motorista, o que for… Tem como hobby a arte, seja pintura, fotografia, música…
Em Berlim e em Barcelona o grafite é extremamente valorizado, Roma tem de tudo.
Vi muitos escultores, Amsterdam pintores e fotógrafos, Londres música… Aqui
está melhorando, mas não espero grande progresso enquanto a base na educação
continuar assim, do jeito que está. Confesso que não espero muito de um país
que utiliza “campos de futebol” como unidade de medida e “venda de carros” como
parâmetro para medir a economia.
Admiro muitos artistas, e o Brasil é um celeiro de
talentos. Gosto dos trabalhos do meu pai (Wilson Iguti), Daniel dos Santos,
Cícero D’avilla, Alex Oiver, Rick Fernandes, Max Porto, Fausto de Martini… Do
exterior curto Jean Baptiste Seckler, Philippe Faraut, Mark Newman e mais um
monte. Fora CG, ilustradores… Vixe… Ficaria meia hora aqui e ainda esqueceria
um monte!
Essa é mais uma curiosidade particular – na hora em que a
figura está sendo esculpida, é o modelador quem pensa em onde e como as
articulações de um boneco serão colocadas ou não, existe um profissional
especificamente responsável por isso? Se é o modelador quem faz tudo, como você
pensa as articulações, como faz para harmonizá-las com a escultura, para evitar
deformidades (como tantas que a gente vê por aí)?
Depende. Tem empresas que preferem que alguém acompanhe o
projeto para definir as partes técnicas em conjunto, outras deixam na minha mão
mesmo. Eu penso na viabilidade em conjunto com a estética. Se você deixar na
mão de um engenheiro ele deformará pensando somente na parte técnica, o artista
pensará somente na estética deixando de lado a viabilidade técnica… Eu junto
tudo e tento agradar os dois ao mesmo tempo… É simples! [risos]
Aproveitando que passamos por isso, será que você poderia
descrever, assim, brevemente, o processo de modelagem de um boneco, se possível
incluindo o momento em que o escultor insere detalhes técnicos, como
articulações, pontos onde vão parafusos e coisa e tal?
Tudo começa com um rascunho, que é detalhado visando a
melhor adaptação para a escultura. Após isso é feito um “esboço de modelagem”
em massa de modelar, para somente marcar posição, estrutura e proporções. Após
esta etapa pode-se terminar a modelagem na massa, tentando atingir o maior
nível de detalhamento que o material permite. Em seguida é feito um molde de
silicone e tirada uma cópia em resina ou cera, que permitem melhor acabamento.
As articulações e locais de parafuso variam de boneco para boneco, mas não há
nada de obscuro nisso, já que o boneco final que você pega em mãos nada mais é
do que uma cópia fiel de como ela foi projetada. Ou seja, as articulações estão
da mesma maneira em que foram feitas no modelo matriz.
Você citou já ter feito trabalhos para grandes marcas,
seja direta ou indiretamente. Entre essas grandes marcas, citou a Brinquedos
Estrela, lugar dos sonhos de um número bem grande de crianças dos anos 80,
início dos 90. Entretanto, quem observa a marca hoje, percebe que a Estrela
(com o perdão do trocadalho) já não brilha mais como antes. Na sua opinião, o
que aconteceu com essa que era uma gigante do mercado? Será que ela um dia
conseguirá voltar a ser o que era?
Eu acho que com a abertura do mercado para o brinquedo
importado junto com aperfeiçoamento das concorrentes a Estrela ficou sendo só
mais uma. Não sei hoje mas há algum tempo atrás falava-se que a empresa estava
passando por muita dificuldade, mas ela não foi a única. Mesmo assim a
reputação da Estrela é muito grande, pois sempre que se fala em brinquedos a
primeira marca a ser lembrada é a da Estrela. Sinceramente não acho que ela
perdeu sua identidade, mas sim que outras empresas conseguiram nivelar com ela.
Talvez falte modernização ou ousadia, mas o mercado de brinquedos brasileiro é
muito inconsistente e não aceita desaforo.
Existe algum personagem, editora, qualquer coisa que você
gostaria de modelar um produto? Qual seria?
Olha, já modelei de tudo um pouco e confesso que depois
que você modela algo que quer parece que fica um vazio, e esse vazio cada vez
mais fica maior. Hoje escrevendo aqui pra você digo que não tem nenhum
personagem famoso que me chame a atenção. Atualmente acho que preferiria
apostar em coisas minhas do que fazer coisas dos outros. O difícil é arranjar
tempo quando se precisa de dinheiro.
Você falou que investe em plastimodelismo. Você coleciona
memorabília também? Tem alguma coleção favorita, algum xodó?
Não tenho nenhuma coleção. Pra falar a verdade até uns 5
anos atrás nem brinquedos desenvolvido por mim eu tinha. Hoje eu já tenho
alguns, mas não costumo gastar dinheiro com isso não. O meu xodó é um NEB
(extraterrestre que vem com os órgãos para fazer cirurgias) Esse foi o único
brinquedo que fiz questão de guardar desde a infância. Eu adoro ele, e como
sempre fui cuidadoso ele está inteirinho, completo e tenho até a caixa
guardada. As vezes pego ele e fico olhando como foi feito, e, sinceramente,
hoje em dia não vejo muitos bonecos com a mesma qualidade.
Ultimamente, a customização se tornou um hábito bastante
popular entre os colecionadores e, ao mesmo tempo, alguns materiais de uso
profissional também se tornaram acessíveis e se popularizaram. Com isso, a
customização, que era algo eminentemente amador, ganhou ares profissionais.
Como é isto para você, que é de fato um profissional do ramo? Há customizadores
que você particularmente admira?
Não me lembro de nenhum customizador em específico, mas
acho louvável pessoas que têm o interesse de mudar o produto ao seu jeito. Isso
é de persistência e inconformismo, ousadia e iniciativa. Gosto disso.
Qual o caminho que alguém que pretenda se tornar um
escultor de brinquedos deve seguir pra entrar na profissão? Tem espaço pra mais
gente? Deixe aí o seu recado pra galera – faça o seu jabá, fale do seu site, de
como te contratar, sei lá! Os leitores do MdM são lisos ou pão-duros, mas vai
que cola…
Antes de mais nada a pessoa tem que ter algum fundamento
de desenho, depois estudar muito , pesquisar muito e em seguida experimentar
materiais de modelagem diferentes até você achar algum em que você se
identifica ou adapta. Sempre haverá espaço, ainda mais se você faz com prazer.
Se você faz as coisas com verdade e de bem consigo mesmo, acho que não tem como
não dar certo. As pessoas precisam entender que cada um tem seu estilo, e não
modela bem somente quem modela anatomia humana perfeitamente ou um velho cheio
de rugas para detalhar. O que é bonito pra você pode não ser pra pessoa ao lado
e vice-versa, então faça por você. Estude. Pesquise.
Obrigado pelo espaço…foi bem legal! De qualquer forma vou
deixar meu site para quem quiser dar uma olhada. Tem tudo lá. Abraço.
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